Chegou a hora H. - Disse-te eu em tom de brincadeira.
Aquele dia em que depois de tantos diálogos, risos, reflexões, brincadeiras e tudo à distância, sentimos que seria obrigatório e quase urgente acontecer. Tínhamos concordado que já se tornava eminente unir expressões a um rosto, vozes a um diálogo.
Embora já tivéssemos uma imagem um do outro, de uma forma mais ou menos natural senti, apesar disso, um nervoso miudinho à medida que o comboio se aproximava e por mais que me tentasse convencer de que seria um encontro perfeitamente normal, não tinha conseguido evitar mesmo nos últimos momentos este sentimento que me tinha invadido o corpo.
Pudemos desfrutar de uma tarde bastante amena, cheia de sol, com muitas confissões à mistura, longos passeios, o que aumentou de uma forma significativa a cumplicidade que já existia entre nós, e que até àquele dia tinha sido apenas através de palavras escritas, que apareciam como magia através de um ecrã, onde cada qual nas suas vidas, fantasiava à sua maneira como seria um encontro frente a frente, durante aquelas últimas semanas. Sentimos a empatia que já nos era comum, e o dia desenrolou-se normalmente.
Vou-te confessar uma coisa. Disseste-me tu por mensagem quando já dentro do comboio me preparava para seguir directa a casa.
Diz…
Desejei-te cobrir-te de beijos ardentes!...Escreveste tu timidamente, após uns longos minutos de espera. Parecia estar a ver as tuas expressões a dizer-me exactamente isto. Agora sim. Por mais que a minha imaginação fosse muito criativa até aquele dia, nunca seria nada como o que observei em ti, fisicamente ali e agora tao perto.
Hum…. Eu sei.E naquele momento pisquei os olhos mentalmente soltando uma gargalhada ao ler as minhas próprias palavras, sendo alvo dos olhares dos restantes passageiros que se encontravam ali por perto, e por alguns instantes, mas de uma forma levemente propositada consegui adivinhar o que te ia no pensamento, mesmo que timidamente. O meu corpo estremeceu ligeiramente ao recordar-me.
E tu, o que é que sentiste?
O mesmo. – Sabia o que isso iria provocar em ti. E não estaria de facto a mentir, apenas seria algo normal, quando começamos a criar na expectativa daquele encontro. Convencia-me eu.
Esta conversa desenrolou-se até chegar a casa, o que durou pouco mais de meia hora, visto que a distancia que nos separava era bem diferente, desde o ponto em que nos afastamos.
Falamos amanhã?
Sim, claro!
Os meus pensamentos voavam vertiginosamente ao encontro daquele dia. Ao encontro dele. Nada tinha acontecido acidentalmente. Sabíamos ambos disso, embora nenhum de nós quisesse de facto, admitir.
Além de mais ou menos planeado mentalmente e em conjunto, tinham-se criado algumas expectativas, mais ou menos reais, outras mais ou menos fantasiadas, mas a realidade é que demos o tao ambicionado passo que já ambos tantas vezes tínhamos confessado, ter imensa vontade.
Leio-te. Nas entrelinhas. Nos pontos finais. Nas reticências que substituíste nos pontos de exclamação, por medo, para que não desaparecesse. Leio-te. Leio-te no silêncio, entre as palavras que não me dizes, entre as que pretendias que fossem ditas e entre aquelas que acabas por dizer. Escrevo-te. Para que vejas aquilo que eu interpreto nos teus silêncios. Nos momentos em que não estas comigo. Assim como as lágrimas que choras no meu rosto e que não é suposto esconder de ti. Assim como os meus pensamentos voam em tua direção e não lhes percebo o seu sentido. Mesmo que por mais estranho te possa parecer. Talvez porque não seja preciso fazer sentido pensar em ti. Porque Amar não tem que ter um raciocínio logico.
Apenas me faz lembrar de ti.
Secaste a minha fonte.
O único sentimento válido que tinha para te passar. O único afeto que alguém conseguiria ainda no futuro reclamar. Arrancaste de mim lágrimas de um sítio que desconhecia, mas ninguém esteve aqui para as amparar. Extraíste de mim o que de melhor teria para partilhar. Subtraíste o que floresceu não sei bem de onde, mas que senti de uma forma tao natural, tao sublime. Nesse momento fui feliz. No seguinte incapaz. Nesse momento não cabia em mim de alegria. No seguinte senti-me abandonada. Nesse momento completa. No seguinte, espezinhada.
Quem padece com isto não sou eu. Desengana-te. Eu já não tenho cura. Quem reclama de mim apenas, aquilo que tu, sim, deixaste morrer. Aquilo que o tempo também não consegue sarar. Aquilo que a chuva intensa não consegue irrigar.